Cadernos de Seguro

Artigo

Para driblar crises


[I]Experiência americana pode ajudar no desenvolvimento de um novo produto no Brasil[/I]

[B]Lauro Vieira de Faria[/B]

Muitas nações passam, atualmente, por processo de mudança na estrutura etária caracterizado pela crescente participação dos idosos nas suas populações. O Brasil não é exceção: projeções do IBGE indicam que os brasileiros idosos de 65 anos ou mais deverão aumentar de 12 milhões em 2008 para 49 milhões em 2050. Por sua vez, a população jovem, entre zero e 24 anos, cairá no mesmo período de 84 milhões para 51 milhões. Isto posto, se para cada idoso existem hoje cerca de sete jovens, em 2050, estimativamente, tal relação será de um para um.

Não é preciso ser economista ou atuário para entender os problemas crescentes que esse fenômeno acarreta para o bom funcionamento dos esquemas de previdência e assistência social baseados no regime de repartição no qual, genericamente, as contribuições de trabalhadores ativos (jovens, na maioria) pagam os benefícios estendidos aos inativos. É fácil prever que os idosos, que são maioria dentre os inativos, se encontram em situação de maior risco, pois sua capacidade de reação é evidentemente menor.

Afortunadamente, nos países desenvolvidos, os mercados criaram um instrumento para lidar com o risco mencionado acima. Trata-se da ?hipoteca reversa? que é um empréstimo contraído por idoso (individual ou cônjuges) tendo como garantia a residência e nunca sendo quitado por valor superior ao desta no fim do contrato. O instrumento permite, assim, a conversão de capital em renda. Obviamente, a hipoteca reversa se aplica apenas ao subgrupo de idosos que têm insuficiência de renda ? pelos motivos apontados acima ou por outros ?, mas possuem suficiência de capital, este incorporado na própria residência. Nos países ricos, tal grupamento é numeroso e bem capitalizado de modo que a demanda potencial é elevada.

Nos Estados Unidos, país que mais desenvolveu a hipoteca reversa, os números demonstram o sucesso: a modalidade mais utilizada, com seguro de crédito concedido pela Administração Federal de Habitação (FHA), saltou de apenas 157 operações em 1990 para 112 mil em 2008 e deve atingir mais de 170 mil agora em 2009. O saldo dos empréstimos segurados pela FHA mais que duplicou desde 2006, sendo, atualmente, de US$ 55 bilhões. Assim, ao contrário dos demais mercados afetados pela crise, o mercado de hipotecas reversas cresce aceleradamente.

No sistema norte-americano, somente pessoas de mais de 62 anos, que possuam efetivamente seus imóveis e residam neles são elegíveis para fazer hipotecas reversas. Satisfeitos esses requisitos e constatado por consultor independente que o tomador entendeu perfeitamente o contrato, não há necessidade de comprovação de renda nem de qualidade de crédito. O empréstimo inicial (principal) depende de algumas variáveis como as taxas de juros, a idade do tomador e o valor do imóvel. Em geral, quanto menores as taxas de juros e maior a idade do proponente, maior o principal. Desde que o imóvel seja adequadamente mantido e os impostos pagos, em nenhuma hipótese, os tomadores são obrigados a abandonar o imóvel. Também não são obrigados a amortizar o empréstimo durante a vigência do contrato. Este finda em razão da morte do tomador, da venda do imóvel ou da mudança permanente para outra residência. Nesses casos, o imóvel é vendido e o saldo devedor ? o principal acrescido de juros, comissões e seguros - pago.

O risco da operação (o valor do imóvel ser inferior ao saldo devedor) é suportado pelo governo no caso das operações ao abrigo da FHA ou pelo emprestador/instituição financeira nos demais casos. O valor residual, decorrente da eventual diferença a maior entre o valor de venda da propriedade e o saldo devedor, retorna ao tomador, se vivo, ou a seus herdeiros.

A oferta de hipotecas reversas depende crucialmente da adequada aferição do risco de que o valor de venda da residência fique aquém do saldo devedor. Tal risco liga-se a dois eventos incertos: o momento de encerramento do contrato, vinculado, em geral, à longevidade do idoso,

02/12/2009 11h55

Por Lauro Vieira de Faria

Economista e consultor da Escola Nacional de Seguros ? Funenseg

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