Cadernos de Seguro

Artigo

A IMPROPRIEDADE DA SÚMULA Nº 465 DO STJ

[I][B]Ao dispensar o segurado de comunicar a venda do veículo ao segurador[/B][/I]

No dia 13 de outubro de 2010, o Superior Tribunal de Justiça - STJ, por sua Segunda Seção, aprovou e editou a súmula nº 465, segundo a qual, ?Ressalvada a hipótese de efetivo agravamento do risco, a seguradora não se exime do dever de indenizar em razão da transferência do veículo sem a sua prévia comunicação?.

Embora se refira ao seguro de automóvel, nada garante não seja ela aplicada também a outros tantos seguros cujo bem segurado seja suscetível de transferência. A título de fundamentação da súmula, o STJ faz referências aos artigos 1.432, 1.443 e 1.463 do Código Civil de 1916, e aos artigos 757, 765 e 785 do vigente Código de 2002.

Na suposta tentativa de amenizar o grau de injuridicidade da súmula, talvez a pretexto de torná-la menos severa para a mutualidade, fez-se constar de seu texto uma ressalva que excetua a obrigação do segurador apenas na hipótese de a transferência significar aumento efetivo do risco envolvido no seguro.

É apenas aparente o benefício da ressalva de retirar de sua aplicação as transferências para pessoas de maior risco, e não o faz sem derrogar expressa disposição de lei, constante do artigo 785 do Código Civil, em prejuízo do princípio constitucional da Separação dos Poderes da República que impede ao Judiciário legislar e ao Legislativo julgar.

Nada obstante à ressalva, a decisão sumulada menoscaba não só o princípio da legalidade como o da segurança jurídica, esmaecendo expressa e clara disposição legal, constante do artigo 785 do vigente Código Civil e, nessa senda, acaba violando postulado constitucional pétreo, de direito fundamental, que assegura a independência dos poderes da República, na medida em que legisla onde o Poder Legislativo já havia legislado. Por mais aberto que seja o sistema de cláusulas do Código Civil, a ingerência se faz indevida, por não se tratar de interpretação mas de desconsideração de preceito legal.

E o fez em consequente violação também ao devido processo legal, fora do leito natural de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade que, de competência originária do STF, esse não vislumbraria, decerto, qualquer eiva de inconstitucionalidade no referido dispositivo do CC desconsiderado pelo STJ, na letra e no espírito.

Desconsiderou-se também o diálogo das fontes, entre o CC e o CDC, pois esse, no artigo 54, § 4º, admite cláusulas limitativas do direito do consumidor, desde que redigidas com clareza e destaque, sendo portanto válida cláusula que dessa forma obrigue o segurado a comunicar ao segurador sempre que alienar o veículo. Tampouco o CDC trataria como consumidor de seguro, no caso, o terceiro que não celebrou com o segurador contrato intuitu personae.

A súmula transforma contrato nominativo em ao portador, borrando construção legislativa irretocável.

Senão vejamos, na letra e no espírito, o disposto no citado artigo 785 do Código, que restou mutilado pela súmula:

Art. 785. Salvo disposição em contrário, admite-se a transferência do contrato a terceiro com a alienação ou cessão do interesse segurado.
§ 1º Se o instrumento contratual é nominativo, a transferência só produz efeitos em relação ao segurador mediante aviso escrito assinado pelo cedente e pelo cessionário.
§ 2º A apólice ou o bilhete à ordem só se transfere por endosso em preto, datado e assinado pelo endossante e pelo endossatário." (os grifos são da transcrição).

O legislador quis assim, o julgador quis assado. Mais um reprovável combustível para alimentar o indesejado ambiente da insegurança jurídica.

Como se vê é nítido o apagão produzido no dispositivo acima, nas partes grifadas que, sem rebuços de dúvidas, estabelecem para os contratos nominativos, como soe ser o de seguro de automóvel (tão nominativo como o de um imóvel, cuja transferência pressupõe formalidades específicas, até porque não se trata de contrato de seguro à ordem ou ao portador, consoante o art. 760 do CC): primeiro, a autorização para constar do contrato a proibição da transferência do seguro

25/02/2011 11h09

Por

Cadernos de Seguro - Uma Publicação da ENS © 2004 - 2024. Todos os direitos reservados.


DATA PROTECTION OFFICER RESPONSÁVEL

Luiz Mattua - ens.lgpd@ens.edu.br
Rua Senador Dantas, 74, Centro - Rio de Janeiro / RJ
Somente assuntos relacionados a Lei Geral de Prote¸ão de Dados (LGPD)
 

Ao navegar em nosso site, vocę reconhece que leu e compreendeu nossa Política de Privacidade.